O sol ainda nem tinha nascido quando saí de casa.
Vesti meu único moletom, com o capuz puxado sobre o rosto, e coloquei o pouco dinheiro que tinha no bolso da calça rasgada.
O mercado negro ficava no distrito abandonado da cidade, entre prédios em ruínas e becos que até os policiais evitavam.
Caminhei rápido pelas ruas silenciosas, ignorando as poucas figuras sombrias que surgiam entre as sombras.
Finalmente, encontrei o prédio que os homens haviam mencionado:
um velho centro comercial, semi-demolido, coberto de pichações.
Subi os degraus rachados, o coração batendo forte.
No hall principal, algumas poucas pessoas vagavam como fantasmas.
Homens grandes, de olhos fundos. Mulheres de roupas rasgadas, sussurrando entre si.
Caçadores falidos. Mercadores de partes de besta.
Gente que já tinha perdido quase tudo, tentando agarrar o que restava.
Eu era só mais um.
Ou pior: nem isso.
Passei horas ali, tentando perguntar sobre como me tornar auxiliar.
A maioria me ignorou.
Alguns riram.
Um chegou a me empurrar, fazendo minhas costas baterem contra a parede suja.
— Some daqui, moleque. Você vai morrer antes de passar o portal — rosnou.
Engoli o orgulho.
Me mantive de pé.
Eu precisava fazer isso. Por Eunha.
Mas à medida que o tempo passava, o desespero começou a me corroer.
Talvez eu estivesse errado.
Talvez esse lugar fosse apenas mais uma armadilha para os desesperados como eu.
Já era quase meio-dia quando pensei em voltar.
Meus passos estavam pesados. Minhas mãos tremiam de frio e cansaço.
Foi então que o vi.
No canto mais distante do hall, sentado em uma cadeira de praia rasgada, estava um homem.
Usava um chapéu de palha largo, chinelo, e uma camisa floral aberta, mesmo no frio cortante da manhã.
Diante dele, uma pequena mesa improvisada exibia um monte de bijuterias baratas: pulseiras de miçangas, anéis de plástico, colares brilhando artificialmente sob a luz suja do lugar.
Parecia deslocado ali.
Quase ridículo.
E, ainda assim, havia algo... estranho.
Seus olhos — meio fechados, preguiçosos — pareciam observar tudo ao redor, como um lobo entediado, mas sempre atento.
Sem saber por quê, meus pés me levaram até ele.
O homem abriu um sorriso preguiçoso, mastigando um palito de dente.
— Quer comprar uma pulseira da sorte, garoto? Primeira do dia é de graça — disse, apontando para os enfeites coloridos.
Fiquei parado, sem saber o que dizer.
Ele me olhou por alguns segundos que pareceram horas.
— Ou talvez você esteja procurando algo mais... valioso.
Minhas costas gelaram.
Ele sabia.
De alguma forma, ele sabia.
— Eu... — comecei, a voz falhando. — Quero trabalhar como auxiliar. Entrar na Terra Espelhada.
O sorriso dele se alargou.
— Quer arriscar a vida para ganhar uns trocados, hein? Igual aos outros.
Balancei a cabeça, firme.
— Não é só pelo dinheiro.
Ele arqueou uma sobrancelha.
— Ah, não?
Hesitei. Depois suspirei, derrotado.
— Minha irmã... ela tá doente. Se eu não arranjar dinheiro, rápido, ela...
Não terminei.
Não precisava.
O homem largou o palito de dente e se inclinou na cadeira, ficando sério pela primeira vez.
Os olhos dele, antes preguiçosos, agora pareciam cortar meu peito como lâminas.
— Você sabe que pode morrer lá dentro, certo?
Você não é forte. Não é treinado.
E ainda assim está disposto?
Engoli em seco.
Olhei para baixo.
Pensei na Eunha.
Em seus sorrisos fracos.
Em suas mãos geladas segurando as minhas.
Ergui a cabeça.
— Estou.
Um silêncio pesado caiu entre nós.
Então, para minha surpresa, ele riu.
Não uma risada debochada, mas uma risada genuína, cheia de algo que parecia... satisfação.
— Bom — disse, pegando uma das pulseiras e jogando para mim. — Você passou.
Peguei o objeto no ar, confuso.
Antes que eu pudesse perguntar, ele se levantou, ficando muito maior do que parecia sentado.
Sua presença era esmagadora, como a de uma fera adormecida que agora despertava.
Ele se aproximou e sussurrou:
— Garoto...
Você teve sorte hoje.
Eu sou Baek Hojin.
E eu estou procurando alguém... como você.
Dei um passo para trás, assustado.
Baek Hojin sorriu de novo, mas desta vez, havia algo de predador em seus olhos.
— Se você quer mesmo mudar sua vida...
Venha ao armazém 7 esta noite.
Leve coragem. E deixe o medo em casa.
Antes que eu pudesse responder, ele se virou, assobiando, como se nada tivesse acontecido.
Olhei para a pulseira na minha mão.
Era simples, feita de miçangas vermelhas e pretas.
Mas quando a segurei firme, senti algo quente pulsando sob meus dedos.
Algo... vivo.
O primeiro passo havia sido dado.